Histórias da CART 3503

Para denunciarmos, para perdoarmos, mas para jamais esquecermos!

terça-feira, 27 de maio de 2008 | 01:41

Carta a Mueda



Do posto de água 9 ao 34, do 34 a Omar, ou do 34 a Mocimba do Rovuma e a ida a Muera; muitas batalhas de vida e de morte se travaram, onde infelizmente a morte em algumas venceu.
Do China ao Chindorilho, das Águas às Bananeiras, e de ti Mueda a Nanglolo, a morte esteve sempre presente, mas por distracção sua ou porque não estava interessada, a maior parte dessas batalhas foram ganhas por esses valorosos rapazes da C.ART. 3503 e talvez sejam esses que te amam, porque do ódio pode nascer o amor, segundo dizem os filósofos; ou quem sabe, passados estes anos é que o nosso amor por ti tenha nascido.
Hoje recordo as tuas madrugadas frescas pela queda do cacimbo; durante a noite; o teu cheiro africano misturado com o cheiro do pão fresco; que tanto se preocupou o padeiro durante a noite em o ter pronto na hora para que os operacionais o fossem buscar, para depois irem para o mato ou para a picada; que normalmente o mínimo era por três dias.
Pão tão fresquinho que por volta do meio-dia já estava seco devido ao calor que fazia no mato.
Durante o dia, quando no aquartelamento se estava, e os helicópteros se avistavam, era porque algo de mal se passava, porque no hospital pousavam. Para o hospital se corria a fim de se saber o que se passava – era mais um que morria, e mais uma vez na morte se pensava.
Nas tuas noites, quando se bebia, tudo se esquecia; até a morte que nos esperava no dia seguinte. Julgávamos por vezes sermos as pessoas mais felizes do mundo, mas quando caíamos na realidade, e sem o efeito da cerveja, agradecíamos a Deus por nos ter dado mais um dia, e pedíamos-lhe que nada de mal nos acontecesse e que nos levasse para junto da família, sãos e salvos.
Tu Mueda, hoje és para mim uma segunda terra mãe, que me ensinaste o valor que a vida tem, lutando muitas vezes contra a morte.
A todos aqueles que em ti lutaram pela vida, um bem ajam.
E tu Mueda, que continuas aí tão distante, será que tens saudades de mim? Aguarda-me, que um dia, se eu puder, vou aí…

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